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sexta-feira, 2 de julho de 2010

DR.JOÃO PINHEIRO DE ANDRADE LYRA - BIOGRAFIA.


APRESENTAÇÃO
 Dr. João Pinheiro de Andrade Lyra
      Pesquisa Maria Angélica Lyra
(filha do autor)


Este trabalho é uma reprodução do livro “Essências do Brasil em Jarros do Japão” do Poeta João Pinheiro Lyra.
O livro original editado em 1951 numa pequena gráfica do município de São José da Laje, Estado de Alagoas, tem apenas 17 centímetros, é todo ilustrado pelo autor, e trata, segundo ele, de “uma interpretação da obra de Omar Ibn-Ibrahim Al-Khayyami, o Poeta-Astrônomo da Pérsia, em haikais, ou tercetos à moda japonesa”.
Mesmo de posse dos clichês, dificilmente teríamos condições de reproduzi-lo. Resolvemos então, com auxílio da tecnologia, optarmos pela cópia do livro no tamanho original dos desenhos a bico de pena, contendo páginas com textos manuscritos pelo autor, e obedecendo, o tanto quanto possível, a estrutura do original.
É um esforço para atender aqueles que buscam conhecer a obra do poeta já que o original é considerado por muitos uma raridade e, acima de tudo é uma homenagem filial pela passagem do cinqüentenário de sua morte.
Para que o poeta João Pinheiro Lyra seja mais bem identificado acrescentamos sua biografia e sua foto.

Maria Angélica Lyra
angelicalyra_307@hotmail.com

João Pinheiro de Andrade Lyra, filho de Líbia de Andrade Lyra e de Carlos Lyra Filho conhecido no meio jornalístico como o “Príncipe do Jornalismo no Nordeste”, nasceu aos três dias do mês de novembro de 1912, em Timbaúba, Estado de Pernambuco, cidade conhecida como “Princesa Serrana” e fez-se filho de São José da Laje, Estado de Alagoas, conhecida como “Princesa das Fronteiras”.

O nome João Pinheiro foi uma homenagem de seu pai ao seu grande amigo e também jornalista, de Minas Gerais.

Com príncipe e princesas em sua trajetória de vida optou por ser um vassalo da arte, da poesia, do sentimento maior: o amor por tudo que é belo.

Foi batizado na cidade de Olinda – PE, aos vinte e oito dias do mês de março de 1913, pelo Cônego Benigno Lyra tendo como padrinhos Salvador Lyra e Antonieta Lyra. Permaneceu em sua terra natal até os oito anos de idade sob os cuidados de seus avós maternos João de Andrade e sua Senhora Maria Lyra Andrade. Em seguida, dando continuidade a sua educação já aos cuidados paternos, estudou em Garanhuns-Pe, e iniciou o curso ginasial no “Ginnasio de São Bento” em São Paulo, onde se destacou como melhor aluno de Francês, de Inglês, de Português e de Religião, recebendo além de certificados e livros, uma medalha de “Honra ao Mérito”. Os cursos médio e superior foram concluídos nos Estados Unidos da América e Europa, respectivamente.

Voltando ao Brasil, João Pinheiro era então identificado como poeta, jornalista, escultor, xilógrafo, pintor, professor, poliglota, músico, engenheiro, manejando a matemática com precisão de cálculos e raciocínio rápido. “... era nos resultados dados a queima-roupa que João Pinheiro revelava sua inteligência admirável, seu inigualável poder de raciocínio, a ponto de parecer-se um falso valor à procura de notoriedade pelo impressionismo”, disse um amigo.

Fixando residência no município de São José da Laje, contraiu matrimônio com Josefa Vieira Lyra com a qual teve sete filhos: Ivan Gregório Lyra (falecido), Eugênio Fabrício Lyra (Corretor de Imóveis), Maria Líbia Lyra Vergeti (artista plástica e professora) Maria Angélica Lyra (Professora), Maria Elisabete Lyra Nobre (Economista), João Pinheiro de Andrade Lyra Filho (João Lyra - Músico) e José Carlos Lyra (Dydha Lyra - Advogado, Artista Plástico, músico e cantor).

Em outubro de 1951, João Pinheiro iniciou a construção de sua residência, no município de São José da Laje – AL., em estilo greco-romano, concluindo-a em junho de 1954, que até hoje chama a atenção de lajenses e visitantes por seu estilo, por conter em sua fachada os signos do zodíaco, medalhões com figuras de Deuses da mitologia grega em mosaicos por ele confeccionados e, na cumeeira da casa uma estátua de Minerva, a Deusa da Sabedoria.


Essa residência, com o passar dos anos recebeu dos lajenses o nome de “Casa dos Signos” e é muito visitada por curiosos, alunos de nível fundamental, médio e superior para pesquisa e elaboração de trabalhos escolares.

Também em 1951, é feito em São José da Laje o primeiro livro do Poeta e o primeiro do município, na Tipografia São José, de propriedade de José de Holanda Cavalcante Valença. ”Essências do Brasil em Jarros do Japão”, é um livro de haicais, com ilustrações à bico de pena feitas pelo autor; com introdução e outras tantas páginas manuscritas, clicheria de Telles de Recife e prefaciado por Mauro Motta. Foram 500 exemplares dessa edição anteprimeira e fora do comércio, 332 com dedicatória e entrega feita pelo autor.
Apaixonado por poesia, João Pinheiro deixa uma produção literária bastante significativa. No gênero haicai são 435, além de poemas, artigos, discursos.

Outras informações:

Escultura
São vários os seus trabalhos em madeira, podendo ser encontrado em sua residência os quadros das duas primeiras turmas de Concluintes ginasiais, molduras trabalhadas, mesa, cadeiras. Consta em seus arquivos informações sobre vários quadros talhados em madeira doados à arquidiocese de Maceió, outros doados para leilões em benefício da paróquia de São José da Laje.

Pintura
A única que dispomos, foi pintada na parede da capela em sua residência representando Cristo crucificado, em seus momentos finais.
Os forros dos quartos, salas e da sala de banho, são pintados desenhos feitos por João Pinheiro, que na época usou moldes vazados para transferir esses desenhos para o teto.

Música 
Tocava piano, violino, violão, bandolim sendo este último talvez o seu instrumento predileto. Era tocando Bandolim, que João Pinheiro despertava a sua amada esposa às madrugadas, tocando entre tantas, uma de suas músicas preferidas, a canção russa – Olhos Negros.

Desenho
São muitos os desenhos a bico de pena que ilustra o seu livro “Essência do Brasil em Jarros do Japão”.Dispomos dos originais e clichês que eram utilizados pelas antigas tipografias para impressão desses desenhos. Em seus arquivos encontramos os esboços de tantos outros.

Biblioteca
Pode-se encontrar em sua biblioteca, livros dos mais diversos assuntos e de vários idiomas. Quem o conheceu diz que o mesmo falava bem o inglês, francês, espanhol, italiano, alemão e com ajuda de dicionário bem traduzia o grego e o japonês.

Marcenaria.
Era intenção de João Pinheiro Lyra, fazer móveis para sua residência, e para tal montou uma marcenaria em um dos salões do primeiro andar, mas só chegou a fazer as cadeiras da copa, cujo encosto alto divisa-se uma lira e um pinheiro.

O Poeta
Quem o conheceu diz que fazia versos com uma rapidez admirável e em qualquer lugar, bastava para isso dispor de papel e lápis.
Em sua residência deixou um arquivo com várias fichas, cada uma com um haikai por ele produzido. Depois de levantamento feito, somando-se os publicados em seu livro, os publicados no ‘Diário de Pernambuco e os inéditos, João Pinheiro produziu 435 kaikais de 14 de julho de 1948 com os três primeiros À Alvorada, conforme se encontra em três dessas fichas, embora que no livro conste como de 1949 (ano que mais produziu), até os três últimos escritos em janeiro de 1951, dois no dia 12 e o último no dia 13 que diz:


Libertação

Borboletas são
Mil cores fugindo às dores
De um cárcere, o chão!


A maioria das fichas contém, além da data, o local em que estava; em algumas o que o inspirou ou quem solicitou ou provocou.

A impressão que nos deixa João Pinheiro é de que andava com essas fichas e lápis ao alcance das mãos e que era muito detalhista.

A exemplo:

Maceió 28 07 49
SÃO PAULO
Cadinho onde a lida
Mistura forças, e apura
Essências de Vida1...

Hoje, mais ou menos 11 horas da manhã, encontrou-se comigo o Amintas, de “A Notícia” e me solicitou uma colaboração poética para uma próxima edição especial em homenagem ao Estado de São Paulo. Enquanto conversávamos escrevi este haikai.
JPLyra ,Maceió, 28/07/49

*Trem M-L
09.10.48
Às armas, Imprensa do Brasil!
Um haikai de João Pinheiro Lyra para os Diários Associados

Se és fera, julgada...
Impõe-te, e a vencer dispõe-te,
Desamordaçada!

Remetido n/d, sob registro aéreo nº 4 639, ao Dr. Assis Chateaubriand, a/c p.e.o. “O Jornal”, Rio.
*Trem M-L. Trem Maceió – Laje

João Pinheiro de Andrade Lyra faleceu às vésperas dos 43 anos, em 05 de outubro de 1955, no Hospital Centenário do Recife. Sepultado no Cemitério Santo Amaro, seus restos mortais encontram-se hoje em São José da Laje, no mausoléu da família.

SOBRE JOÃO PINHEIRO LYRA

Artigos completos e trechos de outros, publicados em jornais.

Gazeta de Alagoas
Maceió – AL.
Ano: 1955
Mês: outubro
Coluna: SOCIEDADE
ELE & ELA

PÁGINA DE SAUDADE

JOÃO PINHEIRO LYRA

Agora que João Pinheiro morreu, eu pergunto a mim mesmo se o seu único livro publicado – “Essências do Brasil em Jarros do Japão” – e conforme o próprio autor “... edição anteprimeira e fora do comércio”, é um livro ótimo, bom ou ruim.
Não sou crítico literário, Nem pretensões tenho a dissecar páginas de versos ou de prosas como o médico que, acadêmico, busca a causa-mortis para o atestado de óbito. Em crítica, julgo que os nossos gostos, nossa preferência o nosso academicismo de julgar não formem o nosso conceito, de acordo com as nossas leituras e estudos sobre estilo, sobre o tema escolhido pelo autor, como se comportam os personagens e quais as suas deduções finais. Procuro apenas saber se o autor conseguiu dizer o que quis ao escrever o drama ou fazer a poesia.
João Pinheiro, que conheci muito bem, primeiro como adversário intransigente, ele, defendendo o integralismo, e eu, o combatendo intransigentemente; e depois, correligionário de 45, na UDN, não era o que supus que fossem todos os camisas-verdes violentos, insensíveis, desumanos, pretensiosos, arrogantes, prussiânicos.
Era uma inteligência rara, sempre a caminhar em busca do Belo, da Arte, do Sentimento. Era simples na aparência, grandioso na intimidade. Vestia-se como um simples, sem olhar para a indumentária. Selecionava os amigos procurando-os dentre os que não fossem maltrapilhos de espírito. Só o Cérebro era a sua Alma. Só a Arte era a sua razão. E só o coração dominava seus impulsos.
Desenhava, pintava, esculpia, sabia música, cantava, era poeta, crítico, jornalista e manejava a Matemática com precisão de cálculos e raciocínio rápido que o confundiam com um adivinho ou embusteiro. E era nos resultados matemáticos de quaisquer cálculos dados a queima roupa, que João Pinheiro revelava sua inteligência admirável, seu inigualável poder de raciocínio, a ponto de parecer-se um falso valor à procura de notoriedade pelo impressionismo.
João Pinheiro, porém, era um homem simples. Rico, desde o berço, filho do grande jornalista Carlos Lyra Filho, o “Príncipe do Jornalismo do Nordeste”, quando militava no “Diário de Pernambuco”, e neto do coronel Carlos Lyra, industrial portentoso, senhor de quase todas as terras do município de minha São José da Laje, era mesmo um simples, a admirar mais a Cultura que o Dinheiro, sua posição social ou qualquer preconceito de religião ou casta. Tanto, que ao dedicar o seu “Essências do Brasil em Jarros do Japão”, haikais lajenses, em página de Saudade e gratidão à memória de seu pai, o fez assim: “ A veneranda memória de Carlos Lyra Filho, poeta, jornalista e industrial, as saudosas e agradecidas homenagens filiais do Autor”. Ele agradecia ao pai, em primeiro lugar, como Poeta, depois como Jornalista, para, por último, o classificar como Industrial. Antes de registrar o homem de letras que fora o seu progenitor, e antes de qualificá-lo como Rico João Pinheiro o situou como homem do Coração, amando o Belo e a Perfeição: como Poeta.
O livro de João Pinheiro, portanto, diz, desde o início, o que ele quis dizer: revelar-se. E foi revelando-se que os temas escolhidos o foram biografando como poeta:
“Esta infelicidade tão feliz,
este amargor que, estranho, sabe a mel,
doçura cujo gosto lembra o fel,
toque extra de divino que Deus quis
dar de presente a alguns dentre milhares
de homens que nascem, deles fez, coitados,
entre os próprios irmãos, uns isolados,
incompreendidos, raros, invulgares,
em traços, que por certo os diferenciam
dos outros, a ligar maldita benção
à maldição bendita da agonia
nesta saudade do Alto, neles grande,
que intimamente os faz sofrer e expande:
a sobre-humana tara da Poesia!...”
Para João Pinheiro, todo o cantar do coração, todo o sentimento da alma, todo o fervor da inteligência: a poesia.
Era o Belo a dominar. Era a perfeição a preferir. E João Pinheiro cultuava a Perfeição com o amor puro de pai que fora, com o desvelo de esposo fiel ao seu único amor. Contrariando sua posição social, opiniões da família, casou-se com a sua amada que o coração preferiu. Era um servo do respeito ao Amor. Só não fora poeta em toda extensão do termo, porque fora um homem organizado. Mais Perfeito que Amante porque, se simétrico em tudo que fazia, não procurou outras mulheres para fixar-se como poeta e boêmio. E é nos mínimos detalhes, que se fixa toda a vida de João Pinheiro, o estudioso cuidadoso e fiel interprete ou copista, ou criador sublime de versos cheios de mistério e reencontros íntimos. Foi um grande desenhista, um grande escultor, um grande poeta.
Cada madeira ferida deixava a marca de sua paciência, da sua investigação nos talhes, quer na simetria das linhas quer no estudo do corte a realizar: tudo tinha a sua época, os seus milímetro medidos, os ângulos contados. Da periferia ao centro, ou do centro ao arco, os dias, se o motivo cronológico, a ordem crescente ou decrescente, se o tema hierárquico.
Cada traço de nanquim, nos seus desenhos, tinha o seu lugar determinado, ou invocava o sentido de sua perfeição na ilustração desejada, como o Ìndice do seu livro, um edifício em três blocos, em perspectiva vista de cima, tendo como cobertura as suas iniciais J. P. laterais, e no centro , as apresentações dividindo o todo dos seus haikais, envolto em brumas a espargirem para os céus a sua sentença: “Vos, Deun Brasiliam que laudo et amo!”.
E nos seus versos, os haikais, o seu encontro consigo mesmo, nos monômios, nos binômios, nas trilogias.
Nos monômios ele compôs “Contraste”:
“Luz...tanta no céu,
meu Deus! E, nos homens Teus,
quanto espesso véu!”
E nos binômios, “Contemplando a beleza”:
“Cor e forma ajudas,
dispondo as suas, compondo
harmonias mudas!”
E vem as trilogias, onde ele separa dois versos de cinco sílabas por um de sete, rimando sempre, neste, a segunda sílaba com a última, e quase todos dedicados “Ao Cérebro”, “A Idéia”, “A Imaginação”, “Da Arte de Escrever”, “A Poesia”, ‘A Música”, “Do Livro”, “De Mãe”, “Ao Filho”, etc.
Vejamos como João Pinheiro definia em haikais a Poesia. “A Grande Construtora”, é o título:
“Blocos-expressões
co’as massas, Poesia, enlaças,
das inspirações!”

Sobre a “Arte de Escrever”, ele fez “Antigo Elogio”, que diz assim:

“Pena, és arma ousada
que , bem dirigida, tem
mais força que a espada!”

“Ao Filho”, ele dedicou este rubái-lyra como classificava os seus rubaiyát, sob o título de “Prolongamento”:
“Em ti viverei,
meu filho, pois compartilho
do ser que eu te dei!”

E na trilogia de “De Mãe”, que aqui vai completa temos:

“Ao Abrigo Infalível
Nas mil tempestades
da Vida és tu, Mãe querida
Porto das Bondades!

Invencibilidade
Ninguém há que ganhe
na pura e meiga doçura,
no amor, de uma Mãe!

E em Fora de Qualquer Dúvida:
Certeza de amar-me...
somente de mãe a gente
dirá sem alarme.”

E foi assim que João Pinheiro viveu: encontrando-se, sendo o que sempre foi, um poeta, um esteta, um sentimental. Um home simples. Um esposo extremado; um pai carinhoso; um bom amigo.

Copiado do original




Jornal Tapejara
Ponta Grossa – Paraná
Ano: 1953

“...me permito ressaltar a poesia singular e reveladora de autêntica cultura de João Pinheiro Lyra, através de seu artístico (o poeta desenhou todo o livro causando um misto de admiração e louvor do Professor De Plácido e Silva) e punjante “Essências do Brasil em Jarros do Japão”.
Tito Galvão Filho
Copiado do original



Jornal de Alagoas
Maceió –AL
Ano:1979

“Transcorridos tantos anos de sua morte física, ainda hoje nos perguntamos que espírito brilhante animou a matéria daquele que na pia batismal recebeu o nome de João Pinheiro de Andrade Lyra: matemático, poliglota, músico, filósofo, pintor, arquiteto e escultor que impressionava a todos pela sua inteligência e sobriedade.
Membro de uma família tradicional de usineiros, fez cursos nos Estados Unidos e na Europa; porém, ao fundo, sua alma sensível parecia viver sempre distante do modernismo e, até mesmo, do próprio tempo em que vivia. Tanto é, que graças ao seu acendrado amor à antiguidade Clássica, a cidadezinha nordestina de São José da Laje, plantada às margens do Canhoto, possui ainda hoje uma casa que é uma reconstituição perfeita de uma moradia romana, como se fora transplantada de Pompéia antes que o Vesúvio a destruísse.”
José Souza Melo
Copiado do original.



O 5 DE OUTUBRO LAJENSE

Ronaldo de Andrade

“ Não se pode negar a João Pinheiro uma posição de relevo no Brasil, no cultivo do haikai, o difícil gênero poético a que se dedicou.”
Poeta Mauro Mota

As pequenas coisas, os feitos aparentemente insignificantes, são moléculas imprescindíveis ao tecido cultural de uma comunidade.


O 5 de Outubro Lajense
Ronaldo de Andrade



As pequenas coisas, os feitos aparentemente insignificantes, são moléculas imprescindíveis ao tecido cultural de uma comunidade. A ausência de zelo com essas preciosidades repercute no contexto social, criando uma atmosfera de indigência expressiva, consolidando a ignorância. Daí nos perguntarmos: - Quantas e quantas pepitas, pequenas coisas que deixamos de observar, preservar e aprender com eles, integram o nosso tecido cultural? A resposta exige que nos debrucemos sobre o presente e sobre o passado com todo o entusiasmo de quem deseja se situar na realidade.

Constato que o 5 de outubro é um dia homônimo ao de qualquer ano. Mas esta constatação não impede que aflore o 5 de outubro de 1955, porque neste dia a minha pequena e muito amada São José da Laje se tomou de silêncio pungente e humilde, ao repique dos sinos, de todas as torres da cidade – Santa Maria, Santa Luzia e Santa Quitéria da Igreja do Galo e do sino Grande da Igreja Nova – que traduziam a notícia da morte do seu poeta municipal, do poeta anônimo dos mundos Oriental e Ocidental, ser e síntese da ida, João Pinheiro de Andrade Lyra. Uma comoção que repercute das lembranças nos conterrâneos ao silêncio das ruas que as águas do Canhoto beberam a partir do outro fenômeno natural – tromba d’água – ocorrido em 1969.

Nós, lajenses, nascidos na década de cinqüenta do século XX, fomos acalentados a crescer com as histórias sobre personalidades marcantes da comunidade – o casal fundador da cidade José Vicente de Lima e Senhorinha Angélica de Mendonça – o consolidador da economia lajense, Carlos Lyra – o urbanizador da cidade, interventor e prefeito, médico Mário Guimarães – o propulsor da fé cristã, vigário Xavier Thuet – o sanitarista Noel Nutels; e com ênfase de estribilho, nessa música de muitas outras estrofes, a brevíssima história do poeta João Pinheiro de Andrade Lyra.

Hoje faz 50 anos da morte de João Pinheiro. Seu legado material foi um palacete que arquitetou e construiu, em estilo greco-romano, na rua do Cajueiro, para orgulho da paisagem urbana local e um curioso livro de haikai, “Essências do Brasil em Jarros do Japão”, criado, diagramado e ilustrado pelo poeta, para a sensibilidade lajense e entronizado na mais alta prateleira das envidraçadas estantes da antiga Biblioteca Pública Municipal de São José da Laje. O palacete é de pedra e barro lajenses; o livro impresso na tipografia de seu José de Holanda pelos lajenses Cleóbulo e Arnaldo Godoy. Em homenagem a esses pequenos-grandes feitos, sua amada celebrou o homem.

Dona Zefinha mandou construir o mausoléu no cemitério do “Alto da Saudade”. Palacete, livro, mausoléu, tríade significante. A olhos vistos a arquitetura airosa. Mas, o pequeno livro, a pepita da vida em haikai, onde encontrar?

“Essências do Brasil em Jarros do Japão” foi o primeiro livro publicado na São José da Laje. João Pinheiro de Andrade Lyra foi o primeiro poeta reconhecido pela vida dos lajenses e a estabelecer um colóquio direto com meus conterrâneos. Essas verdades podem ser confirmadas pelos intelectuais que foram jovens com João Pinheiro – Fernando Pontes, Aloísio Galvão, Luis Araújo, Teônia de Barros, Adélio Vasconcelos, Assis Gonçalves e o Dr. Amaury Vasconcelos de Andrade. É ele quem afirma: “João Pinheiro foi poeta-repentista extraordinário. Daí os grandes sonetos de haikai”.

Repito: Um pequeno palácio grego-romano, um pequeno livro de haikais e uma pequenina e mimosa cidade! Preciosidades que reclamam o nosso olhar, nossa atenção, nossa luta pela integridade do tecido cultural alagoano.


Publicada em “O CORREIO LAGENSE”
N° 11 de 30 de abril de 1951.




Química Antiga

                            João Pinheiro Lyra.

Idade média. Noite enluarada.
Laboratório enorme em que se avista
o quanto é necessário a quem se alista
nas hostes da Ciência condenada.


Na sala, de vapores carregada,
um perseverantíssimo alquimista
de corpo e alma entrega-se à conquista
da, de metais, transmutação sonhada.


E o tempo passa...E traz o novo dia
um novo desengano da alquimia!
Lá fora a lua foge do arrebol,


e o homem vê, tomado de tristeza,
como transforma a sábia Natureza
A prata do luar no oiro do sol!



25-08-1940
Publicada em “O CORREIO LAGENSE”
                              N° 11  de 30 de abril de 1951.



           Os Lusíadas

                                                      João Pinheiro de Andrade Lyra. 
 
Ao cantares, artista a lusa gente
Num monumento escrito, sem igual,
Que eterno fez teu nobre Portugal
Na sua fase mais heróica e ardente,

Estátua formidável, surpreendente,
Levantas-te, Escultor fenomenal,
Num bronze que é sonoro, e tanto val,
Que há de vibrar imorredouramente!

Lendo a tua Epopéia, no entretanto,
Triste certeza vem-me, um desencanto,
E as imortais estrofes são razões:

A Lingua Portuguesa um poeta dando,
Deus, Justiceiro, vai nos relembrando
Que não nos caberá mais um Camões!

Publicado na Revista Caeté, Ano II, nº 2.
                                                               Maceió, julho de 1951












5 comentários:

  1. Eu da tua semente meu Pai,
    Plantei mais três arvores!!
    Peço a Deus que dê frutos
    Com o sabor de tua essência!!!

    JoãoLyraFilho

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  2. Sr. João Lyra: de lá onde estiver, envio essa mensagem pois posso testemunhar que teu filho João Lyra, músico e compositor da mais alta qualidade, honra teu nome e os ensinamentos que recebeu! Tenho imenso prazer em ser sua amiga! Que coisa linda é uma familia nordestina! Quanta sabedoria, inteligência e arte!
    Luciana Rabello

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  3. Meu Caro Dydha,
    de berço e DNA tens a arte, tudo agora registrado, vida longa ao blog!
    Na agenda, S.J. da Laje, plein air com o solar dos Pinheiro Lyras ao Fundo.
    Meu abraço,
    Paulo de Tarso

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  4. Muito bom o blog. Registra um pouco da passagem desse maravilhoso poeta pela literatura brasileira. Passagem essa ainda pouco divulgada porém merecedora de muito mais.Estou trabalhando em uma análise do livro de haicais. E torço para que um dia este possa ser reeditado e publicado novamente.
    Rayane Valença

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  5. PAI
    EU SEI QUE GRANDE HOMEM VOCÊ FOI...
    AINDA SINTO SEU CHEIRO AO SAIR DO BANHO...SUA VOZ LINDA...SEUS DEDOS CONVERSANDO COM SEU BANDOLIM...SEU JEITO ENGRAÇADO DE ESCREVER NO SEU BIRÔ...OUÇO SUAS DECLARAÇÕES DE AMOR PARA MAMÃE...SUA PREOCUPAÇÃO COM NOSSA EDUCAÇÃO...SEU AMOR AOS LIVROS, A LITERATURA, A POESIA...SUA MINERVINA (MÁQUINA QUE ESCREVIA NAS PEÇAS QUE TALHAVA NA MADEIRA)...
    FECHO OS OLHOS E NOS VEJO NA NOSSA CAPELA REZANDO, SAUDANDO O ANJO DO SENHOR ÀS 18:00hs.
    EM TÃO POUCO TEMPO VOCÊ FEZ TANTO!!!
    EU AMO E ADIMIRO VOCÊ POR TODA MINHA VIDA !!!
    SUA FILHA LIBINHA ABRIL 26,2011

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